Teto do Teatro Municipal de Baltazar Dias.
Luigi Manini (1848-1936), 1887 e repintura de Alfredo Miguéis (1883-1943), 1940 (c.).
Fotografia de São Gonçalves de 2021.
Teto do Teatro Municipal do Funchal, ilha da Madeira.
Luigi Manini (1848-1936). Nascido em Cremona, a 8 de março de 1848, num meio social de parcos recursos e sob as dificuldades da onda revolucionária nacionalista que alastrava em Itália, veio a frequentar um curso de ornatos em Milão e entrar, muito novo, para o atelier de Giovanni Zaffeva, como aprendiz. Visitou depois várias cidades do sul de França, onde decorou residências várias, vindo a estabelecer-se, a partir de 1873, em Milão, como cantor lírico e ocupando o lugar de cenógrafo substituto do
Scala, entre 1878 e 1879, seguindo, em julho desse ano para Lisboa, como cenógrafo do Real de São Carlos. Trabalharia então como cenógrafo, mas também como arquiteto em inúmeros projetos, entre os quais, o do
Teatro D. Maria Pia, no Funchal, em 1887. Manteria ainda a sua atividade de cantor lírico até à temporada do São Carlos de 1894-95, encerrando então a sua carreira lírica. Regressaria a Itália após o
regicídio e a implantação da República, depois de acabar a
Quinta da Regaleira, em 1912, o seu mais ambicioso e completo projeto. Faleceu na sua propriedade da serra de Bréscia, que lhe lembrava a paisagem de Sintra e do Buçaco, com 88 anos de idade, a 29 de junho de 1936.
Alfredo Vital Miguéis (Funchal, 23 abr. 1883; idem, 10 jun. 1943). Filho de Joaquim Francisco Miguéis e de Elisa Sara Aguiar Miguéis, frequentou a Escola Industrial do Funchal, matriculando-se na Academia Real de Belas-Artes, onde completou o curso de Pintura Histórica em 1911, tendo sido discípulo de Columbano Bordalo Pinheiro (1857-1929). Em 1911 participou com alguns óleos numa exposição na Sociedade Nacional de Belas Artes, satirizados por Francisco Valença (1882-1962), com texto de Carlos Simões, em
A Sátira, revista humorística de caricaturas, ano 1, nº 4, Lisboa, 1 de junho de 1911. No ano seguinte, 1912, no entanto, recebeu o prémio do legado Visconde de Valmor, para pensionista no estrangeiro, seguindo para Madrid e Paris, vindo a participar entre muitas outras, na célebre
Exposição dos Modernistas de Lisboa de 1923. Professor da Escola Industrial do Funchal, era na altura do seu falecimento vogal da vereação camarária e tendo deixado o corpo principal da sua obra à Câmara do Funchal, que veio depois a perder-se totalmente num incêndio na área da torre do palácio de São Pedro.
Como as grandes cidades europeias, também o Funchal, ao longo do século XIX, lutou pela
construção de um teatro municipal, para servir de palco às principais manifestações culturais da cidade, sociais e até políticas. A localização escolhida foi a parte Sul da antiga cerca do Convento de São Francisco, onde funcionava um mercado, tendo já então a parte Norte dado origem ao chamado “
jardim novo”, hoje Jardim Municipal. O projeto foi entregue ao engenheiro Tomás Augusto Soler (1848; 1883), da cidade do Porto, infelizmente, falecido antes do lançamento da primeira pedra. Essa cerimónia ocorreu a
24 de outubro de 1883, pela mão de vice-presidente, o morgado João Sauvaire da Câmara e Vasconcelos (1828-1894), tendo a obra decorrido sob a responsabilidade do engenheiro José Macedo de Araújo Júnior e, os trabalhos, do mestre de obras Manuel Pereira, também ambos do Porto.
O edifício seguiu as linhas gerais neoclássicas e italianizantes do teatros europeus da sua época, com planta retangular, alçados de 2 pisos, sendo o primeiro de estilo dórico e o superior, jónico, rasgados regularmente e rematados por balaustrada, ao centro da qual se levantam as armas da Câmara Municipal do Funchal. Interiormente apresenta amplo átrio no piso térreo e salão nobre no piso superior, com sala de espetáculos em ferradura, dividida em plateia, frisas laterais e camarotes de 1ª, 2ª e 3ª ordens. Os tectos e as cornijas das principais salas encontram-se decorados por pinturas naturalistas e românticas efetuadas pelo cenógrafo italiano Luígi Manini (1848; 1936) e pelo pintor-decorador português Eugénio Cotrim (1849; 1937). No complexo do Teatro funciona um pequeno café, o
Café do Teatro, ponto de reunião muito característico da sociedade funchalense, assim como gabinetes de direção e de trabalho, camarins e oficinas várias de apoio às inúmeras atividades cénicas, musicais e culturais que ali decorrem.
O Teatro foi inaugurado a
2 de março de 1888, sendo presidente da câmara o visconde do Ribeiro Real (1841-1902), levando à cena a zarzuela "
Las dos Princesas", pela companhia espanhola contratada por D. José Zamorano, vinda expressamente das vizinhas Ilhas Canárias para o efeito. Nos anos seguintes continuaram a atuar companhias espanholas e italianas, em digressão pelas ilhas atlânticas, mas também portuguesas, artistas dos Scala de Milão e de Génova, do Real Teatro de Madrid, assim como os principais atores portugueses até aos dias de hoje. Ainda hoje, no salão de entrada, se encontram expostas as lápides evocativas da passagem pelo Teatro das mais importantes figuras do teatro português e internacional desde os finais do século XIX.
O teatro municipal do Funchal começou por se chamar
Teatro D. Maria Pia, em homenagem à então rainha de Portugal, de origem italiana, passando, após a implantação da República, a
Teatro Funchalense. A partir de 1917, depois da morte do Dr. Manuel de Arriaga, antigo deputado da Madeira e 1º Presidente da República Portuguesa, passou a utilizar o seu nome e, a partir de
9 de abril de 1942, o do dramaturgo madeirense do século XVI, Baltazar Dias. O “
poeta cego da ilha da Madeira”, Baltazar Dias, como é referido por D. João III, em alvará de 29 de fevereiro de 1537, com o privilégio para publicação das suas obras, foi um dos mais importantes autores teatrais da segunda metade do século XVI e ainda é representado em autos populares nas ilhas de São Tomé e Príncipe, em África, no interior do Brasil e no continente europeu português.
O
Teatro Municipal de Baltazar Dias foi palco das mais importantes manifestações culturais na Madeira ao longo de quase século e meio, quer em cena, quer no écran, já que durante certo tempo a sua sala foi a única a exibir filmes na Madeira. Por outro lado, ao longo da sua história, passaram pelo seu palco as mais importantes companhias cénicas portuguesas e europeias. Criteriosamente restaurado, ainda é hoje a sede e o centro mais importante das atividades culturais do Município e, em grande parte, da ilha da Madeira.