Six Months in the West Indies in 1825, Henry Nelson Coleridge, 3.ª edição, Londres, John Murray, 1832, Inglaterra
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Henry Nelson Coleridge, Six Months in the West Indies in 1825, 3.ª edição, Londres, John Murray, 1832, Inglaterra
(1798-1843)
Nascido em 25 out. 1798, filho do Cor. James Coleridge, sobrinho do poeta romântico Samuel Taylor Coleridge (e simultaneamente genro, já que se casou com a sua prima Sara (1802-1852), escritora e tradutora), Henry Nelson Coleridge ficou conhecido pela edição das obras do tio, tendo publicado, em quatro volumes, The Literary Remains of Samuel Taylor Coleridge, e coligido Specimens of the Table Talk of Samuel Taylor Coleridge. Walter Graham, tendo estudado a sua contribuição para os jornais e as revistas da época, considera-o mesmo um dos primeiros e mais importantes intérpretes do romantismo. Educado em Eton, estudou Direito no King’s College, em Cambridge, mas sempre se interessou pela literatura, como comprova a sua colaboração no Etonian, no qual toma partido pela poesia de Wordsworth contra as opiniões de outros colaboradores, como Golightly e M’Farlane. Em 1830, publicou uma obra dedicada à poesia clássica, Introductions to the Study of the Greek Classic Poets.
Em 1825, acompanha o tio, William Hart Coleridge, bispo de Barbados, às Caraíbas, com o propósito de melhorar o estado de saúde. Na viagem, visitou diversos lugares, os quais descreveu em Six Months in the West Indies in 1825 (1826), dando atenção às paisagens, às plantas, aos animais e aos diferentes costumes e tradições dos seus habitantes. O contacto com a realidade do Caribe e com a sua vasta população de escravos levou-o a tornar-se um abolicionista convicto e a escrever sobre o assunto. No caminho paras as Índias Ocidentais, Henry G. Coleridge passa pela Madeira, onde fica algum tempo antes de seguir viagem. A descrição que faz da Ilha é entusiástica, considerando a sua situação geográfica a mais invejável do mundo, já que assegura tanto o conforto europeu como o luxo tropical. Depois de uma atribulada viagem, com os ventos fortes do golfo da Biscaia a criarem no mar um cenário de beleza e terror, a Madeira aparece como um lugar idílico, de tranquilidade e alegria: “O Madeira, Madeira, O thou gem of the ocean, thou paradise of the Atlantic I have no heart to take up my pen to write of the days which I spent in thee [Ó Madeira, Madeira, ó gema do oceano, paraíso do Atlântico não tenho coragem para pegar na pena e escrever sobre os dias que aí passei]” (COLERIDGE, 1826, 16). O “paraíso do Atlântico”, como designa a “plusquam fortunata insula [Ilha mais que afortunada]”, é comparado com a Inglaterra, muito superior pela variedade das sensações provocadas pela natureza e pelo quadro criado pelas ruas e quintas cheias de árvores e flores (Id., Ibid., 17). O lugar ameno e o esplendor da natureza virgem, consonante aliás com a estética do espaço do romantismo, leva-o a fazer incursões na poesia, talvez pela possibilidade de, através dela, despertar no leitor os sentimentos que experimenta: cita Pierre-Joseph Bernard (1708-1775) e versos de Paradise Lost, de John Milton (1608-1674), reservando para a Madeira os que se referem ao Jardim do Éden (“Blossoms and fruits at once of golden hue/Appear'd, with gay enamell’d colors mix’d [Flores e frutas ao mesmo tempo de matiz dourada/Apareciam, adornados com misturas de alegres cores]” (Id., Ibid., 18). O grupo de Coleridge é recebido com grande hospitalidade pelos Ingleses da Ilha, considerando o autor que eles lhe parecem verdadeiros descendentes do antigo mercador inglês, nada tendo a ver com o lojista, mas demonstrando inteligência, independência de espírito e cortesia. Aproveita, assim, para desmentir o boato que corre em Inglaterra, de que os mercadores instalados no Funchal usam vinho de Tenerife para mandar para a ilha Britânica como sendo o prestigiado vinho Madeira.
Sob o efeito benéfico dos Ingleses, o Funchal é uma cidade limpa e não suja, como os Portugueses gostam. A Catedral é descrita como um edifício bonito, mas o hábito de enterrar os mortos nas igrejas desgosta o viajante, que não compreende como os paroquianos não padecem com os efeitos desta tradição. As ruas são bonitas e as casas também, mas os habitantes são escuros e as mulheres, nenhuma bela, ficam a olhar para a rua do que chama o “beatério”. Coleridge faz ainda menção à igreja do convento dos franciscanos, grande parte do qual foi depois convertido em quartel, lamentando que a ignorância e a superstição tenham levado ao desaparecimento da antiga opulência. Das igrejas, a que mais aprecia é a de Nossa Senhora do Monte, pela limpeza e pela vista para o Funchal.
As mulheres da Madeira, acrescenta o viajante, nunca lavam a cara e dizem que as Inglesas estragam a pele com tanta água. Vestem-se com grande opulência quando recebem em casa ou se fazem transportar nos palanquins, deixando de fora um “pretty ancle [bonito tornozelo]” (Id., Ibid., 24). O transporte na Ilha é, aliás, motivo para momentos de grande humor no relato de Coleridge, que ri do absurdo da concorrência entre transportadores e da velocidade que imprimem a cavalos, póneis e mulas. Um acidente entre marinheiros ingleses e o bispo, D. Fr. Joaquim de Menezes Ataíde, felizmente sem consequências graves, é exemplo do que pode acontecer nas ruas estreitas e em declive se não se tiver cuidado. Mas o bispo, conhecedor dos privilégios dos súbditos de Sua Majestade britânica, não cria problemas aos Ingleses menos cuidados. A menção ao bispo faz com que o autor adicione ao seu texto uma nota a propósito do poeta Francisco de Paulo Medina e Vasconcelos, protegido daquele. O poema épico Georgeida, sobre as guerras peninsulares, tem direito a citação e recomendação a Robert Southey. A excursão ao Curral permite-lhe uma descrição tipicamente romântica, na qual a beleza e o esplendor da natureza se misturam com o medo e o espanto provocados pelas ravinas e alturas. As cores, a luz, as sensações são escritas em pinceladas que permitem a visualizações e o envolvimento do leitor.
Talvez a parte mais curiosa do relato seja a visita ao Convento de Santa Clara, onde terá visto as “prettiest flowers for your sweetheart's hair [as mais bonitas flores para o cabelo da tua amada]” (Id., Ibid., 31) e onde o visitante pôde apreciar os bonecos em cera feitos pelas freiras. Mas o que mais o impressiona é a história de Maria Clementina, a que se referia como a “beautiful nun of Madeira [bela freira da Madeira]”, que sofrera desde criança a indiferença da família, sendo, no entanto, tão bela que aos 13 anos já tinha ofertas de casamento. Segundo o autor, foi tratada como a Cinderela, mas sem uma fada madrinha que a ajudasse. Para ajudar a aumentar o dote dos filhos, o pai metera-a no convento aos 18 anos, tendo a jovem tomado votos aos 19: “At this time she was the most beautiful girl in the island, and, what is remarkable in a Portugueze, of a fair complexion, with a brilliant colour, blue eyes, and very long and glossy brown hair [Por este tempo ela era a mais bela donzela da ilha, e, o que é notável numa Portuguesa, com tez clara, de cor forte, olhos azuis, e um longuíssimo e liso cabelo castanho]” (Id., Ibid., 32). Maria Clementina apaixona-se por um oficial português quando as Cortes do Governo Constitucional permitem a abertura das portas dos conventos. Contudo, no período em que estava destinado o casamento, adoece e, com a reversão da lei, acaba por ser obrigada a regressar ao convento. Coleridge consegue falar com a famosa freira através de uma senhora inglesa, oferece-lhe violetas e recebe dela flores. Acha-a bonita, forte e eloquente, ainda que, acrescenta, fale português com a pronúncia da Madeira, que os de Lisboa criticam. Maria Clementina confessa-lhe a dor que tem no coração e Coleridge fica impressionado com o que lhe parece ser a retribuição da sua profunda admiração pela freira: “She dropped a curtesy which seemed a genuflection to her neighbour, raised a violet behind her service-book to her mouth, held it, looked at it, and kissed it in token of an eternal farewell [Fez uma vénia que parecia uma genuflexão à companheira, ergueu uma violeta por trás do livro de orações e, levando-a boca, segurou-a, olhou-a, e beijou-a como penhor de um eterno adeus]” (Id., Ibid., 36). O capitão do navio chega a propor tirá-la do convento e a planear tal ação, mas Coleridge pensa melhor, não sabendo como entregá-la ao prometido marido e, ao mesmo tempo, percebendo que não pode ficar com a “beautiful nun”, já que tem as mãos bastante ocupadas. Fica, assim, Maria Clementina no convento, doce e infeliz: “So God bless thee, and again in very sorrow I say, God bless thee infinitely, sweet and unfortunate Madeiran! [Que Deus te abençoe pois, e de novo com grande pesar te digo que Deus te abençoe infinitamente, doce e infeliz madeirense!]” (Id., Ibid., 37). O relato de Coleridge não passa indiferente e, alguns anos mais tarde, James Edward Alexander refere-o quando visita a Madeira, tendo a curiosidade de ir ao convento procurar Maria Clementina.
O texto de Coleridge segue a linha dos relatos de viajantes estrangeiros, com o elogio e deslumbre pela terra, esplendorosa e edénica, e a expressão de algumas reservas em relação aos seus habitantes pelos hábitos de pouca higiene, ainda que melhorados pela presença dos Ingleses, considerada positiva em termos sociais. Da Madeira ficam as sensações de liberdade e tranquilidade, da variedade de paisagens e da amenidade do clima. Também fica para a posteridade o retrato da “beautiful nun”, que se tornará uma figura icónica relacionada com a Ilha e o Convento de Santa Clara. Henry Nelson Coleridge morre em 26 jan. 1843.
Obras de Henry Nelson Coleridge: Six Months in the West Indies in 1825 (1826). Bibliog.: ALEXANDER, James E., Narrative of a Voyage of Observation among the Colonies of Western Africa in the Flag-Ship Thalia, and of a Campaign in Kaffir Land, on the Staff of the Commander-in-chief, vol. 1, London, Henry Colburn Publisher, 1837; GRAHAM, Walter, “Henry Nelson Coleridge, expositor of romantic criticism”, Philological Quarterly, vol. 4, 1 jan. 1925, pp. 231-238. (Luísa M. Antunes Paolinelli, DEM 3, 2023)