Museus inesperados: O Museu da Lucerna, Gonçalo Pereira Rosa, Viagens, in National Geographic Portugal, 2022, Castro Verde, Alentejo, Portugal.
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Museus inesperados: O Museu da Lucerna.
Pub. por Gonçalo Pereira Rosa, com fotografias de António Cunha, “Museu da Lucerna. O Val das Lucernas”, in National Geographic Portugal, atualizado a 16 de maio de 2022, 12:02.
A revista National Geographic Portugal volta a dar destaque na sua edição especial Viagens, de 2022, às lucernas romanas de Santa Bárbara de Padrões, no concelho de Castro Verde. A informação partilhada pela Câmara de Castro Verde explica que a revista se refere “à maior coleção do mundo de lucernas – um total de 20 mil – descobertas durante as escavações realizadas no ano de 1994, após as obras de ampliação do cemitério local”. “Este espólio único pode ser conhecido no Museu da Lucerna em Castro Verde”, revela a autarquia.
Museu da Lucerna, Castro Verde, Alentejo, Portugal
As lucernas são lamparinas em cerâmica, com um orifício para se deitar o azeite, quase sempre decoradas no topo (ou no disco), com motivos muito diversificados, sendo de certa forma famosas as com cenas eróticas e de sexo explícito, embora algumas sejam contrafações recentes. Começando nos primeiros sécs. antes de Cristo por serem moldadas à mão, rapidamente e dada a necessidade de iluminação, passaram a ser produzidas em série e por molde, sendo algumas assinadas, igualmente utilizadas para fins religiosos, encontrando-se em cemitérios e santuários para iluminarem a outra vida. Trata-se de um artefacto indispensável à vida quotidiana, bem adaptado à tradicional iluminação a azeite mediterrânea e, se no ambiente doméstico fazia recuar as sombras, também na morte iluminaria o caminho oculto da grande viagem, integrando, assim, deposições funerárias. De certa forma, podem-se considerar como dos modelos mais comuns e divulgados do vasto universo da cultura material romana desde as margens do Atlântico até ao Médio Oriente.
Talvez o maior conjunto e a principal exposição e, inclusivamente, a mais intrigante, seja a do Museu da Lucerna, em Castro Verde, que abriu no ano de 2004 e nos oferece uma coleção única de exemplares da época romana (Século I-III d. C.), descobertos a partir de 1994 na localidade de Santa Bárbara dos Padrões, num antigo santuário romano depois utilizado somente como cemitério. As mais de 10 mil lucernas exumadas nos trabalhos arqueológicos, que voltaram a ocorrer em 2003 sob orientação do arqueólogo Manuel Maria da Fonseca Andrade Maia (1945-2021), que, com a mulher, Maria Pereira Maia (1945-2011), se celebrizaram com a descoberta do célebre Vaso de Tavira (c. 1200), em 1995, permitiram preparar e depois mostrar ao público um conjunto único desses utensílios. O intrigante é o volume espantoso dos exemplares, que pode assim ser a maior coleção alguma vez recolhida, não reunindo a do Museu Romano de Colónia (Romisch-Germanisches Museum Cologne), na Alemanha, por exemplo, metade do espólio aqui existente, tendo a Casa de Bragança, em Vila Viçosa, cerca de 50, tal como o Museu Nacional de Arqueologia e assim sucessivamente. Um santuário desta relevância teria seguramente importância determinante no Sul de Portugal e, embora até agora sem nenhuma inscrição que o possa comprovar, tudo leva a crer deveria ser Arannis, referenciado indiretamente por Plínio, o velho (Caio Plínio Segundo, 23-79), que faleceu na erupção do Vesúvio, como "terra dos aranditanos", num dos seus itinerários da História Natural.