Um Arraial na Madeira - Costumes Madeirenses, Matilde Sauvaire da Câmara, Funchal, 1925 (c.), ilha da Madeira
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Um Arraial na Madeira - Costumes Madeirenses
Levado no Teatro Funchalense por um grupo de 60 creanças, n'uma festa para os pobres
Bastantes anos antes, foi levado no mesmo Teatro, numa récita de gala, no dia em que foi aclamado El-Rei o Senhor D. Manuel II
(D. Manuel foi aclamado em Lisboa a 6 de maio de 1908)
Manuscrito de Matilde Sauvaire da Câmara (1871-1957)
Pub. Paulo Miguel Rodrigues, in Teatro Municipal de Baltazar Dias, Funchal, Imprensa Académica, abril de 2019, p. 328.
Espólio do Arquivo Regional da Madeira, Funchal, ilha da Madeira.
Matilde Olímpia Sauvaire da Câmara (Funchal, 23 mar. 1871-Idem, 11 dez. 1957). Foi a mais nova de três irmãs: Maria Celina (1856-1929) e Maria das Dores (1864-1941). Proveniente de uma família da aristocracia funchalense, cuja história se liga ao panorama literário e cultural da ilha, [Maria Celina, bem como Matilde] cresce num ambiente letrado, pautado por uma educação moderna, atenta à literatura e às artes. Crescendo no solar dos Viscondes das Nogueiras, na rua da Mouraria, bem no centro do Funchal, as irmãs Sauvayre tiveram uma educação primorosa, em grande parte acompanhada pela avó, Matilde Isabel Santana e Vasconcelos Moniz de Bettencourt (1805-1888), Viscondessa das Nogueiras, uma figura de grande relevo na sociedade de então. Dominava várias línguas, publicou diversos artigos e poemas, realizou traduções e escreveu alguns romances, além do livro intitulado Diálogos entre uma Avó e suas Netas, escrito em 1862, que dedicou às suas netas. Matilde Sauvaire da Câmara foi a principal responsável pela récita de gala da Visita Régia de junho de 1901 e morreu em 1957, no Funchal, solteira e sem filhos. O pai, João Sauvayre (1828-1894) assinou a construção do Teatro Municipal em 1882 e presidiu à cerimónia do lançamento da primeira pedra a 24 de outubro de 1883. Nascido na freguesia de S. Pedro em janeiro de 1828, filho de pai madeirense e mãe francesa, João Sauvayre geria as propriedades herdadas de seu pai. Casa em 1854 com Matilde Lúcia de Santa Ana e Vasconcelos Moniz de Bettencourt, filha de Jacinto de Santana (1801-1870), 1º visconde das Nogueiras e Matilde Isabel Santana e Vasconcelos Moniz de Bettencourt (14 mar. 1805-23 dez. 1888), conhecida escritora e poetisa, geralmente referida somente como Viscondessa das Nogueiras.
Como as grandes cidades europeias, também o Funchal, ao longo do século XIX, lutou pela construção de um teatro municipal, para servir de palco às principais manifestações culturais da cidade, sociais e até políticas. A localização escolhida foi a parte Sul da antiga cerca do Convento de São Francisco, onde funcionava um mercado, tendo já então a parte Norte dado origem ao chamado “jardim novo”, hoje Jardim Municipal. O projeto foi entregue ao engenheiro Tomás Augusto Soler (1848-1883), da cidade do Porto, infelizmente, falecido antes do lançamento da primeira pedra. Essa cerimónia ocorreu a 24 de outubro de 1883, pela mão de vice-presidente, o morgado João Sauvaire da Câmara e Vasconcelos (1828-1894), tendo a obra decorrido sob a responsabilidade do engenheiro José Macedo de Araújo Júnior e, os trabalhos, do mestre de obras Manuel Pereira, também ambos do Porto.
O edifício seguiu as linhas gerais neoclássicas e italianizantes do teatros europeus da sua época, com planta retangular, alçados de 2 pisos, sendo o primeiro de estilo dórico e o superior, jónico, rasgados regularmente e rematados por balaustrada, ao centro da qual se levantam as armas da Câmara Municipal do Funchal. Interiormente apresenta amplo átrio no piso térreo e salão nobre no piso superior, com sala de espetáculos em ferradura, dividida em plateia, frisas laterais e camarotes de 1ª, 2ª e 3ª ordens. Os tetos e as cornijas das principais salas encontram-se decorados por pinturas naturalistas e românticas efetuadas pelo cenógrafo italiano Luígi Manini (1848-1936) e pelo pintor-decorador português Eugénio Cotrim (1849-1937). No complexo do Teatro funciona um pequeno café, o Café do Teatro, ponto de reunião muito característico da sociedade funchalense, assim como gabinetes de direção e de trabalho, camarins e oficinas várias de apoio às inúmeras atividades cénicas, musicais e culturais que ali decorrem.
O Teatro foi inaugurado a 2 de março de 1888, sendo presidente da câmara o visconde do Ribeiro Real (1841-1902), levando à cena a zarzuela "Las dos Princesas", pela companhia espanhola contratada por D. José Zamorano, vinda expressamente das vizinhas Ilhas Canárias para o efeito. Nos anos seguintes continuaram a atuar companhias espanholas e italianas, em digressão pelas ilhas atlânticas, mas também portuguesas, artistas dos Scala de Milão e de Génova, do Real Teatro de Madrid, assim como os principais atores portugueses até aos dias de hoje. No salão de entrada encontram-se expostas parte das lápides evocativas da passagem pelo Teatro das mais importantes figuras do teatro português e internacional desde os finais do século XIX.
O teatro municipal do Funchal começou por se chamar Teatro D. Maria Pia (1847-1911), em homenagem à então rainha de Portugal, de origem italiana, passando, após a implantação da República, a Teatro Funchalense. A partir de 1917, depois da morte do Dr. Manuel de Arriaga (1840-1917), antigo deputado da Madeira e 1º Presidente da República Portuguesa, passou a utilizar o seu nome e, a partir de 9 de abril de 1942, o do dramaturgo madeirense do século XVI, Baltazar Dias. O “poeta cego da ilha da Madeira”, Baltazar Dias, como é referido por D. João III (1502-1557), em alvará de 29 de fevereiro de 1537, com o privilégio para publicação das suas obras, foi um dos mais importantes autores teatrais portugueses da segunda metade do século XVI e ainda é representado em autos populares nas ilhas de São Tomé e Príncipe, em África, no interior do Brasil e no continente europeu português.
O Teatro Municipal de Baltazar Dias foi palco das mais importantes manifestações culturais na Madeira ao longo de quase século e meio, quer em cena, quer no écran, já que durante certo tempo a sua sala foi a única a exibir filmes em continuidade na Madeira. Por outro lado, ao longo da sua história, passaram pelo seu palco as mais importantes companhias cénicas portuguesas e europeias. Criteriosamente restaurado, ainda é hoje a sede e o centro mais importante das atividades culturais do Município e, em grande parte, da ilha da Madeira.